(Beth Moon - Ancient Trees: Portraits Of Time, Abbeville Press, 2014)


“Eu pertenço à fecundidade
e crescerei enquanto crescem as vidas:
sou jovem com a juventude da água,
sou lento com a lentidão do tempo,
sou puro com a pureza do ar,
escuro com o vinho
da noite
e só estarei imóvel quando seja
tão mineral que não veja nem escute,
nem participe do que nasce e cresce.

Quando escolhi a selva
para aprender a ser,
folha por folha,
estendi as minhas lições
e aprendi a ser raiz, barro profundo,
terra calada, noite cristalina,
e pouco a pouco mais, toda a selva.”

(NERUDA, Pablo. O Caçador de raízes. Antologia Poética, José Olympio, 1994, p. 232.)


quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Fragmentos de Altazor - Vicente Huidobro


(...) Canto I

Silêncio a terra vai dar à luz uma árvore
A morte dormiu no colo de um cisne
E cada pluma tem um distinto tremor
Agora que Deus senta sobre a tempestade
Que pedaços de céu caem e se enredam na selva
E que o tufão despenteia as barbas do pirata
Agora sacai a morta ao vento
Para que o vento abra seus olhos

Silêncio a terra vai dar à luz uma árvore
Tenho cartas secretas na caixa do crânio
Tenho um carvão dolente no fundo do peito
E conduzo meu peito à boca
E a boca à porta do sonho

O mundo entra em mim pelos olhos
Entra em mim pelas mãos entra em mim pelos pés
Entra pela minha boca e sai
Em insetos celestes ou nuvens de palavras pelos poros
Silêncio a terra vai dar à luz uma árvore
Meus olhos na gruta da hipnose
Mastigam o universo que me atravessa como um túnel
Um calafrio de pássaro me sacode os ombros
Calafrio de asas e ondas interiores
Escadas de ondas e asas no sangue
Se rompem as amarras das veias
E salta fora da carne
Sai das portas da terra
Entre pombas espantadas
Habitante de teu destino
Por que queres sair de teu destino?
Por que queres romper os laços de tua estrela
E viajar solitário nos espaços
E cair através de teu corpo de teu zênite a teu nadir?

Não quero ligaduras de astro nem de vento
Ligaduras de luas benignas são para o mar e as mulheres
Dai-me meus violinos de vertigem insubmissa
Minha liberdade de música escapada
Não há perigo na noite pequena encruzilhada
Nem enigma sobre a alma
A palavra eletrizada de sangue e coração
É o grande pára-quedas e o pára-raios de Deus
Habitante de teu destino
Colado a teu caminho como rocha
Vem a hora do sortilégio resignado
Abre a mão de teu espírito
O magnético dedo
Onde o anel da serenidade adolescente
Pousará cantando como o canário pródigo
Largos anos ausente
Silêncio
Se ouve o pulso do mundo como nunca
pálido
A terra acaba de iluminar uma árvore

(1893-1948), Chile

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