(Beth Moon - Ancient Trees: Portraits Of Time, Abbeville Press, 2014)
“Eu pertenço à fecundidade e crescerei enquanto crescem as vidas: sou jovem com a juventude da água, sou lento com a lentidão do tempo, sou puro com a pureza do ar, escuro com o vinho da noite e só estarei imóvel quando seja tão mineral que não veja nem escute, nem participe do que nasce e cresce.
Quando escolhi a selva para aprender a ser, folha por folha, estendi as minhas lições e aprendi a ser raiz, barro profundo, terra calada, noite cristalina, e pouco a pouco mais, toda a selva.”
(NERUDA, Pablo. O Caçador de raízes. Antologia Poética, José Olympio, 1994, p. 232.)
"Vento mistral, caçador de nuvens, Matador de tristezas, varredor dos céus, Como te amo, ó vento que ruge! Não somos os dois primícias De um só ventre, predestinados A um só destino eternamente? Aqui, sobre lisos caminhos nas rochas Corro dançando ao teu encontro, Correndo quando assovias e cantas: Tu que sem navio e sem remo, O mais livre irmão da liberdade, Saltas por sobre mares bravios. Mal acordara, ouvi teu chamado, Precipitei-me para as falésias, Para a dourada muralha junto ao mar. Salve! Como claras, diamantinas Correntes já vinhas, vitorioso, Do lado dos montes, Pelas planuras do céu Vi os teus corcéis galoparem, Vi o carro a te elevar, Vi mesmo a tua mão avançar Quando, sobre o dorso dos cavalos, Como um raio brandia o açoite.— Do carro te vi saltar A fim de mais veloz te arrojares, Como que abreviado em flecha te vi Cair verticalmente no fundo— Como um raio de ouro atravessando As rosas da primeira aurora. Dança agora sobre mil dorsos, Dorsos de ondas, malícias de ondas— Salve quem novas danças cria! Dancemos de mil maneiras, Livre— seja chamada a nossa arte E gaia— a nossa ciência! De cada flor arranquemos Um botão para a nossa glória E duas folhas para a coroa! Dancemos como trovadores Entre os santos e as meretrizes Entre Deus e o mundo inteiro! Quem com os ventos não pode dançar Quem precisa em ataduras se envolver, Enfaixar-se como um velho trôpego, Quem age como os hipócritas, Patetas da honra e falsos da virtude, Ponha-se fora do nosso paraíso! Agitemos as poeiras das estradas Nos narizes dos homens doentes, Atemorizemos todo o bando dos enfermos! Livremos a costa inteira Do alento dos peitos ressequidos, Dos olhares sem ânimo! Expulsemos quem turva o céu, Enegrece o mundo e afasta as nuvens, Tornemos mais claro o reino dos céus! Ouça-se o nosso rugido... Ó espírito De todos os espíritos, junto contigo Ruge a minha felicidade como uma tempestade. — E para eternizar a memória De tal felicidade, toma teu legado, Leva contigo esta coroa para cima! Lança-a mais alto e mais longe e, Escalando impetuoso a escada celeste, Pendura-a— nas estrelas!"
(In: A Gaia Ciência, tradução de Paulo César de Souza)
"Batidas na porta da frente é o tempo Eu bebo um pouquinho pra ter argumento Mas fico sem jeito, calado, ele ri Ele zomba do quanto eu chorei Porque sabe passar e eu não sei
Um dia azul de verão, sinto o vento Há folhas no meu coração é o tempo Recordo um amor que perdi, ele ri Diz que somos iguais, se eu notei Pois não sabe ficar e eu também não sei
E gira em volta de mim, sussurra que apaga os caminhos Que amores terminam no escuro sozinhos
Respondo que ele aprisiona, eu liberto Que ele adormece as paixões, eu desperto E o tempo se rói com inveja de mim Me vigia querendo aprender Como eu morro de amor pra tentar reviver
No fundo é uma eterna criança que não soube amadurecer Eu posso, ele não vai poder me esquecer No fundo é uma eterna criança que não soube amadurecer Eu posso, ele não vai poder me esquecer"
(para a Pérola, que me apresentou a esta linda canção)
"Sempre chega a hora da solidão Sempre chega a hora de arrumar o armário Sempre chega a hora do poeta plêiade Sempre chega a hora em que o camelo tem sede
O tempo passa e engraxa a gastura do sapato Na pressa a gente não nota que a Lua muda de formato Pessoas passam por mim pra pegar o metrô Confundo a vida ser um longa-metragem O diretor segue seu destino de cortar as cenas E o velho vai ficando fraco esvaziando os frascos E já não vai mais ao cinema
Tudo passa e eu ainda ando pensando em você Tudo passa e eu ainda ando pensando em você
Penso quando você partiu Assim... sem olhar pra trás Como um navio que vai ao longe E já nem se lembra do cais Os carros na minha frente vão indo E eu nunca sei pra onde Será que é lá que você se esconde?
Tudo passa e eu ainda ando pensando em você Tudo passa e eu ainda ando pensando em você
A idade aponta na falha dos cabelos Outro mês aponta na folha do calendário As senhoras vão trocando o vestuário As meninas viram a página do diário
O tempo faz tudo valer a pena E nem o erro é desperdício Tudo cresce e o início Deixa de ser início E vai chegando ao meio Aí começo a pensar que nada tem fim.."