(Beth Moon - Ancient Trees: Portraits Of Time, Abbeville Press, 2014)


“Eu pertenço à fecundidade
e crescerei enquanto crescem as vidas:
sou jovem com a juventude da água,
sou lento com a lentidão do tempo,
sou puro com a pureza do ar,
escuro com o vinho
da noite
e só estarei imóvel quando seja
tão mineral que não veja nem escute,
nem participe do que nasce e cresce.

Quando escolhi a selva
para aprender a ser,
folha por folha,
estendi as minhas lições
e aprendi a ser raiz, barro profundo,
terra calada, noite cristalina,
e pouco a pouco mais, toda a selva.”

(NERUDA, Pablo. O Caçador de raízes. Antologia Poética, José Olympio, 1994, p. 232.)


quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Lya Luft



"Deus
eu faço parte do teu gado:
esse que confinas em fogo e paixão,
e às vezes em terrível liberdade.
Sou, como todos, marcada nesse flanco
pelo susto da beleza, pelo terror da perda
e pela funda chaga dessa arte
em que pretendo segurar o mundo.
No fundo, Deus,
eu faço parte da manada
que corre para o impossível,
vasto povo desencontrado
a quem tanges, ignoras
ou contornas com teu olhar absorto.
Deus,
eu faço parte do teu gado
estranhamente humano,
marcado para correr amar morrer
querendo colo, explicação, perdão
e permanência."

(Lya Luft, Em outras palavras, 2006)

sábado, 19 de dezembro de 2009

Fênix - Flávio Venturini / Jorge Vercilo




"Eu!
Prisioneiro meu
Descobri no breu
Uma constelação...

Céus!
Conheci os céus
Pelos olhos seus
Véu de contemplação...

Deus!
Condenado eu fui
A forjar o amor
No aço do rancor
E a transpor as leis
Mesquinhas dos mortais...

Vou!
Entre a redenção
E o esplendor
De por você viver...

Sim!
Quis sair de mim
Esquecer quem sou
E respirar por ti
E assim transpor as leis
Mesquinhas dos mortais...

Agoniza virgem Fênix
O amor!
Entre cinzas arco-íris
Esplendor!
Por viver às juras
De satisfazer o ego mortal...

Coisa pequenina
Centelha divina
Renasceu das cinzas
Onde foi ruína
Pássaro ferido
Hoje é paraíso...

Luz da minha vida
Pedra de alquimia
Tudo o que eu queria
Renascer das cinzas...

E eu!
Quando o frio vem
Nos aquecer o coração
Quando a noite faz nascer
A luz da escuridão
E a dor revela a mais
Esplêndida emoção...

O amor!"





terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Louvação para uma cor - Adélia Prado


“O amarelo faz decorrer de si os mamões e sua polpa,

o amarelo furável.

Ao meio-dia as abelhas, o doce ferrão e o mel.

Os ovos todos e seu núcleo, o óvulo.

Este, dentro, o minúsculo.

Da negritude das vísceras cegas,

amarelo e quente, o minúsculo ponto,

o grão luminoso.

Distende e amacia em bátegas

a pura luz de seu nome,

a cor tropicordiosa.

Acende o cio,

é uma flauta encantada,

um oboé em Bach.

O amarelo engendra.”