(Beth Moon - Ancient Trees: Portraits Of Time, Abbeville Press, 2014)


“Eu pertenço à fecundidade
e crescerei enquanto crescem as vidas:
sou jovem com a juventude da água,
sou lento com a lentidão do tempo,
sou puro com a pureza do ar,
escuro com o vinho
da noite
e só estarei imóvel quando seja
tão mineral que não veja nem escute,
nem participe do que nasce e cresce.

Quando escolhi a selva
para aprender a ser,
folha por folha,
estendi as minhas lições
e aprendi a ser raiz, barro profundo,
terra calada, noite cristalina,
e pouco a pouco mais, toda a selva.”

(NERUDA, Pablo. O Caçador de raízes. Antologia Poética, José Olympio, 1994, p. 232.)


sábado, 5 de maio de 2007

Um começo...


Estava pensando como se constrói um início apenas com palavras, já que em nossa vida tudo é construção, desmoronamento e reconstrução. As palavras não têm início e jamais conseguirão abarcar o começo do amor ou da dor, mas afinal, para que servem elas (palavras)?

Como bem disse Riobaldo, servem para perverter a angústia de dentro da gente. Acredito nisso, e quase acredito também que existam epifanias verbais. Através da palavra inauguram-se novos olhares sobre as velhas estradas poeirentas, inclusive aquelas que conduzem ao nosso mais íntimo sentimento.

Acrescentaria outra qualidade intrínseca da palavra, já explorada por Fernando Pessoa: ela possui propriedades mágicas. Tanto evoca formas-pensamento quanto pode servir de matéria-prima para traçar nosso destino. A alquimia das palavras sempre me fascinou, elas são os grãos à beira da praia que formam o conjunto que chamamos de areia; leito que o mar vem beijar, refletem também a luz da lua. Mortalha dos animais marinhos, berço das tartarugas, mas não somente isso: folhas e raízes também.

Soltas como folhas que o vento leva, profundas como as raízes de alguma árvore centenária, que se fixa teimosamente à terra sem saber que tudo nesta dimensão é transitório e efêmero. Ora leves, graciosamente ternas, ora possuindo a força para nos "deslocar" do nosso eixo, mudar nossa trajetória e nos fazer cativos de um encantamento antigo, que remonta anterior à palavra escrita. Tradição oral, destino. Magia?

Nenhum comentário: